Páginas

segunda-feira, 6 de maio de 2013

.80


  -Papá, por favor pare de falar nisso! - dizia eu colocando a mão dele no meu peito para que sentisse a velocidade a que o meu coração batia.
   -Mas foste tu que pediste para continuar... - respondeu assustado.
   -Papá, por favor, por mais que peça não fale mais. Eu fico assustada quando falamos do que poderá acontecer quando eu morrer papá... eu tenho medo.
   -Joana, tu não podes evitar. Vai acontecer a toda a gente. Um dia também te vai acontecer...
   -CHEGA! Pode parar por favor? Estou a pedir-lhe por favor!

   Sempre fui muito preocupada, sempre me preocupei com o ambiente, com guerras, com epidemias, enfim, com tudo o que pudesse matar se não tivéssemos cuidado (ou se os outros não tivessem cuidado). Ficava apavorada quando havia os ataques no Iraque e o meu irmão como sempre me tentou ajudar de uma maneira engraçada dizia "Nada disso vai chegar aqui, o Sr. Alberto João Jardim não deixa", e eu como era pequenina acreditava. Tinha pavor da gripe da aves, da gripe suína, do dengue, de tudo. Para verem como eu era preocupada demais, cheguei a receber um daqueles e-mails que diziam que eu tinha que enviar aquilo a trinta pessoas ou morria uma semana depois, e fiquei pálida e a gritar pela minha mãe porque não tinha os trinta contactos! Era habitual visitar sites sobre o ambiente quando um dia estava a vaguear na Internet e vejo uma notícia sobre uma Cimeira que tinha havido por causa do ambiente. Curiosa como sou, abri o link para ler o resto da notícia e aproveitei para ver os comentários e para ver se as pessoas se preocupavam tanto quanto eu. Num dos comentários estava "Palhaçada! Google -> 2012. Pesquisem!". Ora bem, isto ainda estávamos no ano 2008. Mais uma vez, como sou curiosa, fui ao Google e pesquisei o tal "2012". Para minha grande surpresa e desgosta vi em letras bem grandes "FIM DO MUNDO 21-12-2012". Bem, é que não imaginam, entrei em pânico, comecei a chorar e a pensar que não ia poder ter a vida que os meus pais tiveram, que não ia poder ir para a universidade, que nem ia poder fazer 18 anos! Que não ia poder ser mãe que era o meu maior sonho e também que não me ia poder casar!
   Já tinha estado em psicólogos antes por causa do "jogo do copo" ou "jogo dos espíritos" (coisa que ainda não percebi nem quero perceber, porque hoje em dia ainda me mete medo!), mas como o assunto tinha ficado esquecido desisti de ir à psicóloga, também porque era muito caro. Entretanto, em 2009, a minha mãe adoeceu, teve cancro e no dia em que a minha mãe foi para Lisboa para começar os tratamentos, fui a uma palestra da minha psicóloga com os tios com que eu iria ficar. Logo no início da palestra ela põe um vídeo do planeta Terra e de ser atingido por uma força gigantesca e ela disse que "a vida na Terra vai acabar, não só para nós, mas também para os animais e para as plantas" e no fim do vídeo estava "21-12-2012". Comecei a entrar novamente em pânico, tive que sair da palestra. Pagar 10€ para ouvir aquilo? Ainda por cima quando a minha mãe, o meu pai e o meu irmão tinham ido para o continente? Passei anos a pensar neste assusto, anos com medo, com pavor. Tinha pesadelos com tsunamis, com o suposto fim do mundo, e conforme o tempo ia passando, mais os pesadelos se iam intensificando. Chegou o famoso filme "2012" que retratava o que poderia acontecer no dia, e eu não conseguia vê-lo senão era logo calmantes p'ra baixo. Nos últimos meses as piadas sobre o acontecimento era frequentes e eu tentava entrar na onda para não dar a parte fraca, quando o que realmente sentia era pavor!
   Chegou finalmente o dia 20 de Dezembro. Passei o dia todo a chorar, com ataques de pânico, a minha tia teve que me dar pelo menos uns três calmantes para ficar estável. Nesse dia à noite o meu tio fez uma festa em casa para toda a família e é claro que toda a gente sabia do meu estado. Quando lá cheguei já estavam todos e um dos meus tios disse-me "Então Joana, querias melhor despedida que esta?". Desabei. Nenhum dos calmantes me safou. Comecei a chorar, a soluçar e quase nem conseguia respirar. O meu pai também começou a chorar, não pelo mesmo motivo que eu, mas sim com medo que me pudesse dar um ataque cardíaco. As minhas primas pequeninas ficaram preocupadas e eu não lhes queria dizer o motivo porque estava assim, portanto obriguei-me a parar de chorar e a controlar-me por elas. O meu telemóvel foi-me tirado porque estava ver no Facebook a ver se alguém dizia alguma coisa e houve um parvalhão que publicou que o Japão tinha sido atingido por um enorme sismo e tsunami onde tinham morrido milhares de pessoas. Fiquei sem falar com o meu namorado, mas em compensação estava com a minha família que é a mais importante do mundo! Passou a meia noite e não sei porquê mas acalmei-me imenso.
   A maior culpada disto tudo foi sem dúvida a minha antiga psicóloga quando disse o que não devia. Por vezes apetece-me lá ir e abanar-lhe a cabeça para ver se ela anda bem do juízo! Hoje em dia penso "Perdi tantos anos da minha vida com este medo para quê mesmo?".

Sem comentários:

Enviar um comentário